Não pretendo determinar os motivos que levam alguém a trair, nem o "certo ou errado" dependendo dos motivos apresentados, mas tão somente passar o que sente a pessoa traída, no que tange à situação em que se encontra.


O amor de sua vida costuma ser perfeito aos seus olhos, indiferente às falhas humanas que a todos pertence (incluindo você), e da forma como a ama, é impossível aceitar que você sentiria atração afetiva ou sexual por outra pessoa, e você espera o mesmo dela.

Quando se descobre, o peso do mundo cai sobre suas costas em um primeiro momento, e a reação óbvia é a raiva. É o momento em que você se sente efetivamente traído. Você imagina essa pessoa a quem você ama falando com outra, tocando outra, gostando de outra. Um gosto amargo sobe à sua boca, como uma ânsia de vômito que vem do inferno. Você se torna cego e surdo à tudo e todos, com somente a raiva a sua frente e o desejo de morte imediata, de dar um fim a tudo.

Em pouco tempo a raiva é substituída por um misto dos piores sentimentos, aparentemente injetados em você como uma droga produzida por Hades. Culpa, frustração, medo, dúvida, tudo colabora para minar sua alma até que não sobre nada de você.

A culpa por tudo que você fez e levou sua parceira a isso é esmagadora. Mesmo que você não tenha dado motivos imediatos para o que ocorreu, ela dirá coisas de anos atrás e usará como motivo. A verdade é que talvez tudo que ela esteja dizendo seja só para justificar o injustificável, no entanto, você acreditará, porque é mais fácil do que aceitar a verdade nua e crua: ela gosta de outra pessoa, afetiva e sexualmente, que não é você.

Tal fato leva à frustração. Quando se ama alguém espera-se que você será a única pessoa que ela amará de volta. A frase de Vinicius, "que não seja eterno, posto que é chama, mas que seja infinito enquanto dure", cai como uma cruz sobre suas costas, pois você vê que o tempo "infinito" de seu "eterno amor", chegou ao fim. Todos os passeios apaixonados de antes, momentos íntimos de tirar o fôlego e filmes românticos assistidos juntos perdem o sentido para você, como perdeu para ela quando ela decidiu o trair. A frustração de saber que seu amor não é correspondido (por mais que ela diga que é) é insuportável, e você aceita que gastou seu tempo e entregou seu amor a alguém que não sentia o mesmo por você.

Você deixa de se sentir homem neste momento, como se tivessem o capado (física e mentalmente). Não se sente bem o suficiente para continuar vivendo e suas faculdades mentais são prejudicadas (dois mais dois torna-se difícil sem calculadora). Você pede a Deus (e a outros) que o levem daqui mas ninguém te atende, parecendo ser sua sina passar por tal provação digna de ser cantada por Bertran de Born. 

Se a pessoa ainda deseja continuar com você, o medo e a dúvida são adicionados à equação macabra. Você quer acreditar que aquela mulher ainda o ama, que tudo foi um engano, um abalo mental de Lúcifer a fim de desestruturar uma família, mas você jamais acreditará nisso de verdade.

Existe uma verdade a qual você sabe, mas se recusa a saber: Ela quis.

Sim, pois independente do que ela sente por você, naquele momento de nada valia tais sentimentos. Independente da importância que um tem para o outro, de quanto tempo vocês tem de caminhada juntos, das coisas que tiveram e construíram ao longo do tempo, uma aventura amorosa e sexual valou mais do que você. E ninguém a obrigou a cometer o ato, ela simplesmente quis.

Isso torna impossível acreditar no amor dela por você e, por mais que ele ainda exista, você sabe que não é recíproco ao que você sente por ela e que em algum momento ela sentiu algo por alguém que conhece a muito menos tempo que superou em muito qualquer coisa que ela sente por você, pois caso contrário simplesmente nada teria acontecido.

Se ela demonstra sentir falta da pessoa em questão, desejo de manter contato ou sentimentos positivos em relação a ele, tudo se torna cruelmente fatal para sua mente. Pois você sabe que mesmo que ela continue com você, o que ela sente por ele é forte e um dia retornará à tona. Não se trata de "se", mas de "quando". E por mais que você esteja disposto a dedicar mais tempo de sua vida e amor de seu peito para ela, o dia que ele chamar, ela irá. E se ela não for pelos vínculos que mantém com você, se lamentará internamente e você saberá por toda sua existência, mesmo que não o fale.

As lembranças boas estarão manchadas, os momentos que antes quando lembrados lhe arrancavam um sorriso discreto em uma viagem longa para o trabalho se tornam borrões indecifráveis. Tudo de bom que foi vivido torna-se uma dor no peito insuportável, que fisicamente baixa sua pressão, causa frio no corpo inteiro, dor de cabeça e ânsia de vômito. E o pior é que você é incapaz de não lembrar.

A realidade que você evita neste momento, é que aquela frase célebre "o tempo cura tudo" é uma grande mentira. Se você não estiver com ela, em um curto período de tempo ela estará com ele ou com outra pessoa (e se você a ama, a vida inteira é um curto período de tempo para você), afinal, vocês não se encontram mais em um relacionamento e ela não deve nenhuma lealdade a você. Cabe ainda lembrar que seu amor é que permanece preso a ela, mas o dela já se libertou de você muito antes. E se você ficar com ela, ela sempre se lembrará da pessoa com a qual teve um caso, ainda mais se houverem sentimentos positivos entre eles.

De qualquer forma, continuando ou não com a mulher que você ama, você está condenado. O sofrimento de agora não vai passar, no máximo será retido a uma pequena parcela de seus pensamentos como mecanismo de defesa, mas você jamais se lembrará do fato menos de dez vezes ao dia, fora os pesadelos, pro resto de sua vida. Se você ficar com ela, sofrerá eternamente pela desconfiança de seus sentimentos em relação à você e em relação a outra pessoa (dúvida que nem deveria existir, pois torna-se óbvio que ela deixou de te amar como você a ama a muito tempo), e se não ficar, será a mesma coisa.